Novo estudo revela grande dominância da Aroeira-do-sertão em áreas nativas, o que pode prejudicar a biodiversidade e restauração.
A Mata Atlântica é um dos ecossistemas mais ameaçados e, ao mesmo tempo, mais ricos em biodiversidade do mundo. Mesmo após séculos de desmatamento, áreas como as florestas ciliares do Rio Doce, em Minas Gerais, ainda sustentam uma variedade de plantas essenciais para a manutenção dos ecossistemas e de várias outras espécies.
Recentemente, uma pesquisa realizada por cientistas do Laboratório de Ecologia Evolutiva e Biodiversidade, do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, analisou as florestas ciliares preservadas nessa região e revelou descobertas importantes para a restauração desse ecossistema.
Com a análise de 45 parcelas de floresta em três locais situados na região de Conselheiro Pena, setor médio da bacia do Rio Doce, em Minas Gerais, o estudo identificou 28 espécies de árvores adultas e 26 espécies jovens, destacando a presença dominante da espécie Astronium urundeuva (popularmente conhecida como aroeira-do-sertão). Esse tipo de predominância, ou “monodominância”, pode ser prejudicial à biodiversidade, uma vez que impede o desenvolvimento de outras plantas nativas.
Aroeiras-do-sertão (Astronium urundeuva) dominando a paisagem em um trecho de mata ciliar no município de Conselheiro Pena. Foto: João Carlos Figueiredo.
As causas que podem ter levado a essa excessiva abundância da espécie estão provavelmente relacionadas com o longo e intenso histórico de degradação da floresta que margeia o Rio Doce, especificamente nesta região. Esse cenário representa um desafio para a recuperação natural da floresta, especialmente em áreas que foram degradadas por atividades humanas, como o rompimento da barragem de Fundão em 2015, que afetou aproximadamente 1.469 hectares de florestas na região.
A pesquisa também destacou a importância do solo para o desenvolvimento das espécies e para a composição geral das florestas. Em áreas onde o solo é pobre em nutrientes e tem alta acidez, a aroeira-do-sertão tende a prosperar, enquanto solos mais ricos favorecem uma variedade maior de espécies. Esses resultados sugerem que uma estratégia de restauração bem-sucedida precisa levar em conta as condições específicas do solo para estimular o crescimento de uma comunidade vegetal diversificada e resiliente.
O trabalho contribui com informações valiosas para a "Década de Restauração de Ecossistemas" das Nações Unidas, uma iniciativa global para reverter a degradação ambiental até 2030. Com base em ecossistemas de referência, ou seja, áreas naturais preservadas que servem como modelos, os cientistas podem entender melhor os elementos necessários para recuperar áreas danificadas. Ao evitar o uso da aroeira-do-sertão em áreas de restauração, os especialistas esperam reduzir sua invasão e permitir o desenvolvimento de uma maior diversidade de plantas nativas.
A pesquisa ressalta ainda que políticas públicas precisam considerar a complexidade ecológica e a importância da biodiversidade para garantir o sucesso de projetos de restauração.
“Ao entender a relação entre o solo e as espécies que o ocupam, damos um passo importante para proteger e restaurar a Mata Atlântica, permitindo que ela continue a oferecer benefícios para o meio ambiente e para as pessoas”, concluíram os pesquisadores.
A pesquisa representa um caminho para o futuro das florestas do Rio Doce e da Mata Atlântica como um todo, inspirando ações baseadas em ciência para a preservação e recuperação de um dos ecossistemas mais preciosos e ameaçados do Brasil.